SNA - Foto 12

Contratos de Mútuo Conversível: Empréstimo ou Investimento?

Em regra, sociedades precisam de recursos para poder conduzir suas atividades. Esta afirmação é especialmente verdadeira para novos empreendimentos, seja uma startup ou o desenvolvimento de novas oportunidades dentro de uma grande organização. É preciso dinheiro para criar um produto ou desenvolver um serviço, capacitar pessoal e arcar com todos os demais custos relacionados à atividade.

Existem diversas soluções possíveis para resolver esta equação, desde a utilização de recursos próprios da organização oriundos de receitas de outras atividades, passando por capitalização pelos sócios através de aporte de recursos como aumento de capital ou empréstimo, emissão de títulos de crédito (conversíveis ou não), busca de novos investidores e a adoção de estruturas dos chamados mútuos conversíveis, entre outros.

A decisão por um ou outro modelo, apesar de ter que considerar as diferentes consequências jurídicas de cada caso, depende em grande parte da visão de longo prazo dos sócios ou responsáveis com relação ao negócio específico.

Neste cenário, a utilização de estruturas mistas com endividamento da sociedade que permite o pagamento do valor levantado mediante a entrega de participação societária (como debentures conversíveis, contratos de mútuo conversível e outros) é vista com bons olhos em muitos empreendimentos, especialmente no caso de startups. Nestes casos, ao mesmo tempo em que conseguem recursos a um custo normalmente mais baixo do que em operações de financiamento de mercado, os fundadores não entregam, em um primeiro momento, participação no capital social de seus negócios a terceiros.

Isso porque contratos de mútuo conversível estabelecem inicialmente uma relação de empréstimo entre as partes, podendo conter previsão de prazo para repagamento e a incidência de juros, entre outros, mas já assegurando ao credo o direito de exigir que o valor da dívida seja convertido em participação societária. Desta forma, apesar de o credor não fazer parte do quadro social da devedora quando da celebração do negócio, já são determinadas as regras a serem adotadas para permitir a conversão do valor devido em participação, com a fixação do percentual do capital social a que o investidor terá direito (e, portanto, o valuation do empreendimento a ser utilizado) e as medidas a serem tomadas para viabilizar a conversão (como necessidade de aumento de capital e de transformação de tipo societário, por exemplo).

Contratos mais elaborados trazem também regras de governança aplicáveis durante a vigência do mútuo, além de definir aquelas que passarão a valer após a conversão (muitas vezes já trazendo inclusive os termos do acordo de sócios a ser assinado naquele momento). Isto faz sentido para permitir ao credor algum nível de controle (ou participação) sobre as atividades e a vida societária do empreendimento, como medida de proteção de investimento.

Assim, apesar de não se tratar efetivamente de um sócio do negócio, o contrato de mútuo conversível permite ao investidor agir até certo ponto como se fizesse parte do quadro social, exercendo influência no direcionamento e decisões relacionadas ao empreendimento.

Trata-se, portanto, de modelo que traz vantagens para ambas as partes: empreendedores captam recursos a um custo mais atraente, não abrem mão de parte do capital social em favor de terceiros estranhos ao negócio e não incorrem nos custos (e esforços administrativos) relacionados a empréstimos bancários ou às necessárias modificações societárias, enquanto investidores fazem aportes em novos negócios sem efetivamente assumirem riscos inerentes à posição de sócio, mas com a segurança de participarem do processo decisório do empreendimento e já ter regras definidas para a conversão de seu crédito em participação, podendo inclusive se beneficiar de valorizações do negócio durante o prazo de vigência do contrato.

Em suma, a adoção do modelo de mútuo conversível pode e deve ser considerada para a capitalização de empreendimentos como alternativa a ferramentas mais tradicionais. Inúmeros são os benefícios para credores e devedores, que precisam ser avaliados à luz da situação de cada negócio. Os termos de cada operação podem variar bastante por diversas razões, negociais ou relacionadas ao projeto específico, e é fundamental que a documentação que irá reger a relação seja elaborada pelas partes e seus assessores considerando tais particularidades e com uma visão de longo prazo do relacionamento entre o investidor, a sociedade e seus sócios.

 

Rio de Janeiro, julho 2019

Este artigo tem caráter meramente informativo e traz apenas comentários gerais sobre a matéria em análise, de forma que não deve ser interpretado como contendo uma opinião, aconselhamento ou recomendação por parte de Stockler Nunes Advogados para aplicação a uma situação específica.